AVISO:
Este texto foi anteriormente postado no
blog do Social Rock Club.
Se você o leu lá, ignore-o aqui.
AVISO 2:
Dia 8 de junho fez 63 anos que 1984 foi
lançado e dia 9 foi aniversário do Matt Bellamy, então achei oportuno publicar este post de novo.
Para a grande maioria, a relação da banda
Muse com a ficção se resume à trilha sonora dos filmes da série Crepúsculo (o
que meio que estigmatizou a banda, já que a série de livros/filmes sobre os
vampiros de Stephenie Meyer desperta o ódio na mesma proporção em que angariou
fãs ardorosos). Mas uma olhada mais atenta e é fácil ver como a ficção vem
inspirando a banda em suas músicas e clipes.
Tem como ver o clipe de Time is running out e
não se lembrar do Dr Fantástico do Kubrick?
E de todas as vezes que o Muse buscou
inspiração na ficção, nenhuma ficou tão evidente como no álbum The Resistance, de 2009 e atulhado de referências ao livro 1984 de George Orwell.
1984 foi publicado em 1949 e conta a história
de Winston Smith, cidadão de uma sociedade oligárquica e coletivista, onde todos
são observados de perto e contralados pelo Grande Irmão (em inglês Big Brother,
e sim, foi de 1984 que saiu o termo que batizou aquela atrocidade televisiva).
“O
Grande Irmão é onipotente. Cada sucesso, realização, vitória, descobrimento
científico, toda sabedoria, sapiência, virtude, felicidade, são atribuídos
diretamente à sua liderança e inspiração”.
Em meio a tanta repressão, Smith se depara
com a insignificância de sua vida. Desiludido com sua existência miserável e
consciente de que “respeitando as leis menores podia infringir as maiores”, ele
começa uma rebelião contra o sistema.
Enquanto luta contra sua insignificância e
contra o sistema, Smith se apaixona por Julia – um romance que vai contra as
regras que sufocam Smith e que aos leitores mais desatentos pode parecer
simplesmente mais um obstáculo para o personagem tropeçar e cair nas garras de
seus opressores.
Matt Bellamy,
vocalista e guitarrista do Muse, disse em entrevista que leu 1984 quando estava na escola e na época só prestou atenção aos aspéctos políticos da história, mas ao reler
o livro anos depois foi a história de Smith e Julia que lhe
causou maior impacto.
“Essa
idéia de que o
amor era o único lugar onde havia
um pouco de liberdade. O ato de amar pode ser um ato político nesse tipo de cenário, como o único lugar onde o Estado não pode invadir sua privacidade.”
O impacto que a releitura de 1984 causou em
Bellamy fica evidente em Resistance, segunda faixa do álbum. Ali estão todos os
questionamentos de Winston – “será que
nosso segredo está seguro esta noite?”, “ou será que nosso mundo está
desmoronando?”, “isto pode estar errado, mas deveria estar certo” – e a
convicção de que “Love is our resistance”.
Em
MK ULTRA Winston Smith e Julia lutam para manter seu relacionamento contra a pressão do Estado.
“O comprimento de onda cresce
lentamente,
Noções coercivas se expandem
novamente
Um universo preso em uma lágrima
Ressoa no núcleo,
Cria leis não-naturais
Substitui amor e felicidade por medo
Quanta decepção você pode suportar?
Quantas mentiras você criará?
Quanto tempo até você desmoronar?
Sua mente está perto do colapso”
Como 1984 não foi escrito por Stephenie
Meyer, o final feliz não é garantido. Winston e Julia são pegos pela Polícia do
Pensamento, e é nesta altura do livro que Orwell deixa claro que é de dentro para
fora que se destrói um indivíduo. Os dois são torturados e acabam delatando um
ao outro. Diante da traição e da certeza de ter sido traído, Winston e Julia se
separam e a rebelião de Winston chega ao fim.
Guiding
Light, quinta faixa do álbum, retrata a desorientação e o vazio de Winston
depois que a Polícia do Pensamento o libera.
“Você era minha luz orientadora
E o conforto e o aconchego não podem
ser encontrados
Eu ainda procuro por você
Mas estou perdido, destruído, e
gelado, e confuso
Sem uma luz orientadora”
O mais perturbador de 1984 é que, salvo
alguns extremos, George Orwell conseguiu descrever bem a sociedade atual. “Hoje
o que havia era medo, ódio, dor, porém nenhuma dignidade de emoção, nenhuma
mágoa profunda e complexa”. E matt Bellamy demonstrou uma sensibilidade absurda
ao perceber que é em suas paixões que um individuo mostra resistência contra
todo o controle e influência da sociedade em que vive.