"O
amor elimina o medo; mas reciprocamente o medo elimina o amor. E não apenas o
amor. O medo elimina a inteligência, elimina a bondade, elimina todo pensamento
de beleza e verdade. Só persiste o desespero mudo ou forçadamente jovial de
quem pressente a obscena Presença no canto do quarto e sabe que a porta está
trancada, que não há janelas. E então a coisa o acomete. Ele sente uma mão na
sua manga, respira um bafo fétido, quando o ajudante do carrasco se inclina
quase amorosamente para ele. “É a sua vez, irmão. Por aqui, tenha a bondade.” E
num instante o seu terror silencioso se transforma em frenesi tão violento
quanto inútil. Não é mais um homem entre os seus semelhantes, não mais um ser
racional falando articuladamente a outros seres racionais; somente um animal
ferido, ululando e se debatendo na armadilha. Pois, no fim, o medo elimina no
homem a própria humanidade. E o medo, meus amigos, o medo é a própria base e
fundamento da vida moderna. Medo da tão apregoada tecnologia que, enquanto
eleva o nosso padrão de vida, aumenta a probabilidade de nossa morte violenta.
Medo da ciência que tira com uma das mãos ainda mais do que tão prodigamente
distribui com a outra. Medo das instituições manifestamente fatais pelas quais,
em nossa lealdade suicida, estamos prontos a matar ou morrer. Medo dos Grandes
Homens que elevamos, por aclamação popular, a um poder que eles usam,
inevitavelmente, para nos massacrar e escravizar. Medo da guerra que nós não
queremos mas tudo fazemos apara desencadear."
Uma vez, há algum tempo, eu quis escrever um
post sobre O Macaco e a Essência – livro de Aldous Huxley de onde o treco acima
foi retirado. Essa foi uma daquelas aspirações estupidas que se tem de vez em
quando e que raríssimas vezes dão em alguma coisa e que definitivamente nunca
dão certo.
Como em qualquer texto metido à besta que
busca enaltecer um livro que o escrevinhador/blogueiro achou muito, muito,
muito bom, este post começaria com a sinopse ou uma breve explicação sobre o
que o livro que deve ser enaltecido trata, e este seria o primeiro erro, já que
este tipo de informação é encontrado facilmente (e nós agradecemos ao Google
por esta facilidade) e todo mundo sabe que qualquer informação que você vai
atrás por interesse próprio é muito mais apreciada do que aquela que é
esfregada na nossa cara.
Mas o grande problema de querer escrever
qualquer coisa sobre este livro é que tudo e qualquer coisa que eu escrevesse
ficaria inevitavelmente aquém do livro (porque o bagulho é bom e a brisa é
louca). E enumerando mais alguns contras à ideia do post sobre O Macaco e a
Essência, a vontade foi engavetada e ficou em coma por um bom tempo, até que
está semana eu esbarrei no treco acima e ela resolveu ressuscitar-se.
A solução para suprir esta vontade imbecil
foi simples: postar o trecho acima e deixa-lo agir como tapa na cara avulso e
resumir este blábláblá todo em duas palavras: leia Huxley. Aliás, leia qualquer
coisa do Huxley. Mais aliás ainda (esta expressão existe?), leia qualquer coisa
de qualquer grande autor, permita-se ter acesso às grandes ideias e desfrutar
da companhia das grandes mentes, mesmo que seja apenas através de um livro.