sábado, 27 de agosto de 2011

Medo


Ele buscava o topo da montanha a qualquer custo. Nada o impedia de sonhar cada vez mais alto. Nada o fazia perder a crença de um dia alcançar o estrelato que tanto sonhou. Nem mesmo o fato de ter perdido tudo, até mesmo seu emprego o fez desistir. Ele quer isso, não para provar alguma coisa para aqueles que não acreditaram, mas para ele mesmo que sempre acreditou. Para o seu ego, apenas.
Acordava cedo todos os dias como se ainda estivesse empregado, caminhava pelas ruas com sua câmera, a procura daquilo que um dia poderia lançá-lo longe.
Até que numa fria manhã de terça feira, resolveu comer alguma coisa só para enganar o estomago mais um pouco. Mas eis que ao entrar naquele bar tudo estava prestes a mudar. Chegou até o balcão e antes mesmo que pudesse pedir alguma coisa, ouviu a arma engatilhando atrás de sua cabeça.
Rezou muito, pediu para que ao menos pudesse sair vivo daquela situação. Mas antes que o meliante fosse embora, se deu conta que aquilo era só o começo do rumo ao estrelato que tanto buscou. Abriu os olhos e naquele instante viu que tudo tinha acabado. Mas não para ele.
Aquela sequência de acontecimentos momentâneos o incomodou por muito tempo. Mas não ao ponto de fazê-lo desistir de encontrar aquele que o fez encontrar o que precisava para chegar de novo ao topo que nunca pôde ver de perto.
O tempo parecia correr contra ele, mas não desistiu. Acreditou que cegamente que agora sabia o porquê de ser repórter. Buscou informações em todos os lugares e por todos os meios, exatamente como aprendeu nos tempos de faculdade e de quando estava ainda no jornal. E após muito tempo perguntando em todos os becos, para todos aqueles que pareciam "perigosos", finalmente uma pista que poderia seguir. Os dias passaram e ele acompanhou ao longe o bandido que colocou a arma em sua cabeça, ia memorizando todos os passos rotineiros do homem. Pensava em como poderia abordar um sujeito que poderia tê-lo matado. Não tinha idéia se estava daquele jeito por medo ou ansiedade. Começou a se questionar se a fama valia tanto assim.
Todos os dias ele respirava fundo e acompanhava aquele homem, claro que ele já deveria estar desconfiado de estar sendo seguido e que isso poderia acabar mal, tinha que pensar nas possibilidades, pensou que seu suor já exalava medo. Mas não ia recuar, parou como sempre ao lado do poste, olhando para frente, esperando o momento que o meliante sairia daquela porta e formulava várias perguntas novas, mesmo que já tivesse muitas anotadas. Mas algo estava errado, já passava do horário e nada da porta se abrir, aquela rua movimentada como sempre parecia bem vazia, as pessoas todas pareciam encarar esse repórter desempregado.
"-Ei, por que você fica aí o dia todo olhando ali? Você é policial?" perguntou o bandido surgindo ao seu lado. Andou até ficar de frente. Encararam-se ambos estavam maltrapilhos, estavam frente a frente. E aquele rosto que nunca chegou a ver tão perto, o fez lembrar-se do som daquilo que o vez ver tudo além do que queria. Não era o medo que realmente sentiu aquele momento, não era nada além da vontade de fazer uma proposta da qual poderia um dia se arrepender, mas que o alçaria da forma que sonhou.
"-Não, não sou policial, sou só um repórter, mas preciso muito falar com você." Aquela frase ecoou dentro de sua mente, seu coração parecia acelerar.
E o meliante aceitou conversar. Aquele homem sombrio, que parecia não ter expressões, nem demonstrava qualquer emoção. Mas agora era tarde para recuar. Fez a proposta, falou de sua grande idéia. "Um sequestro?" - perguntou o meliante. "Sim, deixe-me explicar". Naquela hora, todas suas anotações escritas e mentais pareciam ter desaparecido, que proposta era aquela que ele fazia a um malfeitor?
"-A minha idéia é simularmos um sequestro meu, onde vou relatar tudo o que passei, depois escreveria sobre o sequestrador, ambos seremos astros, ambos teremos fama e fortuna, não importando como conseguimos". Era tudo muito bem planejado, principalmente por ser um improviso de tudo que ele deixou para trás ao contar isso.
Contou tudo, explicou os detalhes de seu plano, não teria como dar errado. Mas dependia do bandido aceitar, a grana era alta, claro, porque mesmo desempregado, ele era um repórter conhecido na mídia, foram muitos anos dentro do mesmo jornal, as pessoas sabiam quem ele era, iriam querer ajudá-lo num momento de dificuldade como esse. E como as coisas poderiam dar errado? Mas nem tudo pode dar tão certo.
O bandido e o repórter seguiram para dentro do apartamento onde o bandido morava, conversaram sobre o plano, era realmente muito bom para ser algo apenas improvisado. Pediu ao homem um copo d'água, viu a arma sobre a mesa, aquele ser que um dia colocou a arma em sua cabeça estava de costas, assim como ele estava quando se viram pela primeira vez. Não pensou duas vezes, foi tomado novamente pelo medo, mas agora era ele quem estava em vantagem. Engatilhou a arma, pegou uma almofada do chão e encostou no bandido. Aquele homem que nunca parecia expressar nada, fechou o rosto, dava medo até mesmo de pensar qualquer coisa, eis que a arma é disparada, e, naquele apartamento sujo e escuro, isolado, quem poderia saber que eles estavam lá, ou quem saberia ao menos quem eram eles. Um disparo abafado por uma almofada. Foi só o que se ouviu e o que nunca ecoou. Tudo parecia mais escuro, muito mais.
Ele limpa as digitais da arma, sai andando tenta não demonstrar qualquer emoção ou sentimento. Seus sonhos estavam enterrados de vez. Aquele homem que um dia sonhou em ser o maior repórter que já se ouviu falar acabou de matar. Sorria escondido, estava satisfeito. Não queria mais os sonhos do passado, queria apenas ter a satisfação de tirar a vida daquele que poderia te-lo matado. Mas e agora esta era sua nova realidade? Esta seria sua nova vida?
A sensação do medo, a frieza, não sabia explicar o que sentia, o que se passou naquele instante em que puxou o gatilho, não sabia expressar ao certo o que houve, mas estava satisfeito, como se tivesse virado uma pagina mal escrita. E agora manchada de sangue, uma marca que jamais poderá tirar de sua vida, que jamais irá revelar, não sabia por que fez isso, não sabia explicar nem a si mesmo por que mudou de idéia, da entrevista, ao sequestro, à morte. Agora vai para casa escrever uma crônica sobre seus momentos de pavor ao quase morrer, mas guardando em seu intimo a sensação de ter estado do lado oposto da situação, afinal, agora ele pode ter um emprego de novo, será a melhor história que já escreveu e que nunca a contará por completo.

domingo, 21 de agosto de 2011

TRÊS VEZES MORTO


Conto mórbido e inspirado em uma música dos Stones que recebeu menção honrosa no III Concurso Claudionor Ribeiro de Contos


          O barulho da sirene me mantém acordado, um grito contínuo que não me deixa dormir. Eu deveria estar sentindo dor, mas eu não sinto nada, apenas sei que a dor está ali. Saber é diferente de sentir.
Levanto um pouco a cabeça na tentativa de ver o estrago, mas tudo o que eu vejo é que um velho está sentado do meu lado segurando a minha mão. Ele me lança um olhar complacente e não diz nenhuma palavra, mas eu sei que ele compreende tudo e conhece todos os passos que foram necessários para me colocar dentro daquela ambulância. E em toda a sua benevolência ele não me julga, embora ele saiba tudo que eu fiz.
O toque da mão dele na minha é todo contato humano que já existiu, mas é completamente desprovido de calor humano. As linhas em seu rosto contam uma história que eu nunca vou conhecer.
“Você entende?”, ele me pergunta sem proferir qualquer palavra.
Eu respondo que sim, eu entendo. Eu entendo que esta é minha última noite e que a corrida de ambulância é meu último passeio. Antes de o sol nascer de novo eu já vou ter partido, este é meu fim.
Mais uma vez sem recorrer às palavras, ele me pergunta se eu sei o que é a morte. Eu respondo que sempre achei que morte é quando você deixa de ser o que é e passa a ser qualquer outra coisa. O velho acena que sim com a cabeça. Ele sabe o que eu sei.
E eu sei que todo mundo morre. Alguns morrem um pouco a cada dia e outros, tudo de uma vez. Eu ia experimentando a morte dos dois jeitos.
           Comecei a morrer há alguns anos, quando arrumei um trabalho que odiava. O serviço era bom, salário razoável, a empresa muito respeitada e eu odiava o meu trabalho.
Mas a vida é assim mesmo, não é? É isso que é ser adulto e responsável. Ou pelo menos era o que eu acreditava que era.
            O trabalho que eu odiava foi me consumindo e me transformando aos poucos, eu só era eu mesmo no meu tempo livre. Eu vivia para os fins de semana e feriados, só depois do horário comercial da sexta-feira é que eu me sentia vivo. E quando eu vivia, eu tinha que viver ao máximo. Quarenta e oito horas para estar vivo, e tudo o que pudesse potencializar a aventura de estar vivo antes do monstro da segunda-feira chegar para me matar era bem-vindo.
Acredite em mim, você pode fugir de si mesmo para sempre, basta você preencher seu tempo com tudo aquilo que não é sobre você. Existem lugares com som tão alto que você não consegue escutar seus próprios pensamentos, substâncias que entorpecem seus sentidos a ponto de nenhum deles conseguir perceber a vida que você leva, e há todo o tipo de estimulo para você correr desesperadamente atrás daquilo que você não precisa e não tem certeza se realmente quer. Está tudo aí ao seu alcance, fácil acesso. Na dose certa você vai se dissolvendo aos poucos e nem percebe.
O único problema é que esse tipo de coisa pode te matar.
Comigo aconteceu isso, eu morri. Fui morrendo quando os meses foram passando e se transformaram em um ano e depois um ano e meio. Eu deixei de odiar o meu trabalho e passei a me odiar por me submeter a algo que eu detestava tanto. Ansiar pela sexta-feira à noite não era mais o bastante, meu tempo vivo sempre acabava tão rápido e as horas em que eu não estava fugindo pareciam se arrastar cada vez mais, cada vez mais lentas. Então eu me perguntei por que esperar até sexta-feira à noite e comecei a providenciar doses de fim de semana para curar a ressaca na segunda-feira, passei a encarar a terça-feira à noite como sexta e quarta-feira como meu feriado particular. Até que chegou um ponto em que eu não era mais eu em dia nenhum, eu era a fuga de mim mesmo em tempo integral.
E de repente eu me vi deitado num leito de hospital e me perguntei o que eu estava fazendo ali. O velho estava sentado em uma cadeira próxima à cama, foi ele quem respondeu minha pergunta.
As faixas amarelas pintadas sobre o asfalto preto – ele falou daquele jeito dele, sem palavras.
E eu me lembrei de tudo.
Eu estava bêbado no meu carro, dirigindo por uma estrada – que estrada era aquela é o tipo de informação que agora não tem mais importância. Eu só queria continuar dirigindo.
O rádio do carro estava ligado e eu via o som que saia dos alto-falantes como ondas, que saiam se contorcendo das caixas de som, se curvavam quando encontravam algum obstáculo e então seguiam se dissipando.
Nem perdi meu tempo querendo saber por que eu estava vendo aquilo ou por que eu nunca tinha visto aquilo antes. Talvez eu nunca tivesse reparado. E entretido com as imagens que se moviam conforme a música eu me atrapalhei em uma troca de marcha.
O motor do carro morreu, eu tentei dar a partida de novo e o carro engasgou. Outra tentativa e o mesmo resultado. Eu saí do carro e abri o capô, olhei para aquele monte de peças e cabos sem saber por que é que eu tinha me dado ao trabalho de fazer aquilo – eu nunca entendi nada de mecânica.
Voltei para dentro do carro e girei a chave na ignição mais uma vez, veio o mesmo som engasgado. O carro não ia pegar mesmo e eu estava ali no meio do nada.
Por mais um tempo me deixei entreter pelas ondas de som, mas acabei ficando impaciente. Então saí do carro e comecei a andar, só andar.
Quando me dei conta estava andando sobre aquelas duas faixas amarelas que separam uma pista da outra. E era reconfortante a sensação de ter uma direção a seguir, tudo o que eu tinha que fazer era colocar um pé na frente do outro e continuar em cima da linha. Eu gostei da simplicidade daquilo. Todo o resto era confuso e complicado, mas ali naquele momento tudo o que me interessava era o contraste dos meus sapatos pretos sobre a faixa amarela pintada no chão.
            Para onde eu estava indo? Por quanto tempo eu caminhei sobre aquelas linhas? Até onde eu chegaria se aquele carro não tivesse me atingido? Eu não sei, e isso pouco importa agora.
          Um caminhão que vinha na direção oposta a que eu seguia teve que desviar e seguir pelo acostamento para não me atingir. Eu vi as ondas do som dos pneus se enroscando uma nas outras e então se espalhando pelo asfalto quando o caminhão desviou. Depois de um tempo um carro apareceu do nada e buzinou, com as ondas do som da buzina se dissipando para todos os lados.
            Eu segui andando sobre as faixas, até que numa curva vi dois faróis vindo para cima de mim e depois não vi mais nada.
            E então eu estava na ambulância. Então eu me vi no leito do hospital.
          Uma enfermeira entrou no quarto. Ela sorri para mim, é aquele tipo de sorriso que diz que vai ficar tudo bem e que mesmo sendo uma mentira aquilo te faz bem. Sustentando sua expressão tranqüilizadora ela me aplica uma injeção.
Eu não senti a agulha cravada na minha pele, a única coisa que senti foi o efeito. A injeção foi tão libertadora quanto todas as fugas, aos poucos me privou dos meus sentidos que diziam que eu fiz tudo errado.
            Mais um sorriso mentindo que tudo ia ficar bem e a enfermeira foi embora. E mais uma vez estamos só eu, o velho e a certeza da minha morte.
            Dentro do quarto do hospital, entre paredes pintadas de um branco impessoal e o sob o zumbido de lâmpadas fluorescentes, o tempo parece estagnado. Mas isso é só impressão, na verdade ele está correndo como sempre esteve.
Como eu sabia que ia acontecer, antes do dia amanhecer o velho se levanta da cadeira e acena para mim. Chegou a hora. Ele me entrega meu casaco – não o casaco ensangüentado e amarrotado que eu vestia quanto me trouxeram para o hospital, mas um casaco limpo, o mesmo casaco só que em perfeitas condições. Ele me ajuda a vestir o casaco, eu me levanto da cama e nós dois seguimos para fora do quarto.
A mão do velho repousa no meu ombro, protetora e me encorajando, enquanto andamos pelo corredor. E nesta hora eu entendo que o velho também está morrendo, ele está morrendo naquele exato momento, enquanto andamos lado a lado. Aquele velho é tudo o que eu poderia ter sido, todas as experiências que eu viveria se continuasse vivo, o velho morre junto comigo porque aquele velho é tudo o que eu nunca vou ser. As linhas no rosto dele contam uma história que eu nunca vou conhecer, uma história não vivida.
          A cada passo sinto pesar mais e mais a constatação de que vou permanecer para sempre jovem, para sempre preso na apatia antes dos trinta. Eu morri quando desisti de mim mesmo, eu morri quando aquele carro me atropelou e eu morri quando perdi a chance de viver tudo o que poderia ter sido.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Dois Lados

Crônica que escrevi para participar de um concurso de literatura de Jundiai. Infelizmente não deu, mas continuamos tentanto, então, segue o texto, espero que gostem.



Quando a gente cresce, começa a ver o que sempre esteve bem na frente e nunca percebemos.
Eu, assim, como qualquer pessoa, sempre tive amigos em todos os cantos. Alguns que não gostavam da escola, outros que acreditavam em um futuro diferente, aqueles que queriam só trabalhar. Em qualquer coisa, em qualquer lugar. Foi como começou o triste calvário daquele que sempre foi o mais novo de nós. Seus pais estavam sempre mudando de casa ou emprego, nunca se apegaram a lugar algum. Talvez isso tenha colaborado para ele nunca ter tido interesse nos estudos. Depois de mais uma mudança de cidade, finalmente o garoto voltou ao ponto de partida, o bairro que cresceu e todos o conheciam, mas aquilo ainda não era o suficiente, não para ele. Largou a escola e começou a trabalhar, ganhava mal e não conseguia o suficiente, mas era só um menino de dezesseis anos.
Na sua ânsia por ganhar cada vez mais, viu que isso era realmente uma necessidade absurda quando começou a namorar. Ela era uma menina simples, tanto quanto ele ou as pessoas do seu bairro. Foi quando algumas reviravoltas aconteceram. E era preciso muita força para saber dizer “não”. Mas não foi este o caso. Nós o vimos conversando com uns velhos conhecidos, daqueles que cumprimentamos, mas não temos intimidade, mas ele, sedento em sua ganância pediu uma ajuda, uma indicação para algum serviço, quem sabe...
Foi quando tudo que eu conhecia mudou. Aquele menino, que por tanto tempo quis ser apenas um de nós, estar com os mais velhos, simplesmente levar uma vida tranqüila, esse mesmo garoto estava vendendo drogas. E o pior, vendia bem. Foi quando descobrimos que até mesmo quem nunca imaginamos que era usuário. Tudo era novo e surpreendente para ele e para nós quando ouvíamos as histórias. Isso sem contar que o dinheiro estava mesmo vindo em quantias cada vez maiores e ele queria cada vez mais.
E como sempre acreditamos que algo pode mudar, a namorada dele sempre pedia para largar isso tudo, voltar a estudar ter um trabalho honesto, mas ele estava bem, estava por cima, porque é que iria abandonar isso tudo?
E já tudo na sua vida sempre acabava de pernas para o ar, eis que o garoto já com quase dezoito anos tornou-se pai. Foi o que o ajudou a entender melhor o mundo. Seu pai pode não ter sido o melhor exemplo que teve na vida, mas ele queria ser um bom exemplo para seu filho, aquele bebê não teria uma vida como ele teve, seria alguém na vida. Então, para minha surpresa, o garoto, agora pai, largou o tráfico, mas não seria tão simples.
Quando se entra no submundo você faz muitos amigos e uma quantidade proporcional de inimigos. E ele acabou preso. Há quase um ano armaram uma emboscada, não se sabe ao certo o que realmente aconteceu naquela noite em que ele foi preso, justo quando estava totalmente limpo, trabalhando num mercadinho do bairro. Parecia tudo tão bem armado que ele mesmo já tinha duvidas de sua inocência e aceitou ir para a cadeia.
Lá dentro ele reencontrou velhos conhecidos da época que esteve no auge, disse à todos em alto e bom som, que não queria mais se envolver no mundo do tráfico, porque agora ele é responsável por uma outra vida, que assim que a pena acabar, ele tem uma família para sustentar, que quer uma vida honesta, por mais difícil que seja, mas seu filho, vai precisar de um bom exemplo, é só o que ele quer. O tempo passou e sempre temos notícias dele, até porque sua namorada, sempre o visita e nos diz que ele sente falta da época que tudo que ele queria era crescer e poder ir jogar bola conosco. Ele, assim como nós, sempre vai se lembrar dessa época, quando o mundo ainda tinha aquela fina película escondendo algumas coisas de nós mesmos. O que aprendi com esse garoto? O tráfico existe sim, muito perto de você e de mim. Está em todos os cantos e leva junto aqueles que acabam cedendo às pressões, que para muitos é apenas uma fraqueza, mas não é. Não é assim, não importa a sua classe social, grau de instrução, quem somos, basta um segundo de fraqueza, um segundo em que queremos ter o mundo e muito mais para ceder. E começa assim.
É nessas horas que percebo que é preciso um pequeno choque para entrar nisto e que uma vida, pode salvar outra, não é sempre. Não será sempre assim, mas este é um caso que me fez pensar. Depois de tudo o que passou, ele precisou virar pai para entender tudo aquilo que nunca pôde aprender. Talvez ele só queira uma segunda chance, nós sempre damos uma segunda chance para muitas pessoas e situações, mas nunca quando é um caso no qual a pessoa se entregou a criminalidade, não merece perdão. Está em nosso subconsciente. Está dentro de nós. Mas e quando a pessoa é alguém que conhecemos? Seria hora de rever alguns conceitos? Seria este o momento de reflexão que sempre ouço falar e nunca realmente o sigo seriamente? Se é, está na hora de começar a pensar de novo nos meus próprios conceitos, porque agora sei que o mundo se esconde atrás de finas mascaras e nunca sabemos quem realmente é quem, até que as mascaras caiam.