quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Dois Lados

Crônica que escrevi para participar de um concurso de literatura de Jundiai. Infelizmente não deu, mas continuamos tentanto, então, segue o texto, espero que gostem.



Quando a gente cresce, começa a ver o que sempre esteve bem na frente e nunca percebemos.
Eu, assim, como qualquer pessoa, sempre tive amigos em todos os cantos. Alguns que não gostavam da escola, outros que acreditavam em um futuro diferente, aqueles que queriam só trabalhar. Em qualquer coisa, em qualquer lugar. Foi como começou o triste calvário daquele que sempre foi o mais novo de nós. Seus pais estavam sempre mudando de casa ou emprego, nunca se apegaram a lugar algum. Talvez isso tenha colaborado para ele nunca ter tido interesse nos estudos. Depois de mais uma mudança de cidade, finalmente o garoto voltou ao ponto de partida, o bairro que cresceu e todos o conheciam, mas aquilo ainda não era o suficiente, não para ele. Largou a escola e começou a trabalhar, ganhava mal e não conseguia o suficiente, mas era só um menino de dezesseis anos.
Na sua ânsia por ganhar cada vez mais, viu que isso era realmente uma necessidade absurda quando começou a namorar. Ela era uma menina simples, tanto quanto ele ou as pessoas do seu bairro. Foi quando algumas reviravoltas aconteceram. E era preciso muita força para saber dizer “não”. Mas não foi este o caso. Nós o vimos conversando com uns velhos conhecidos, daqueles que cumprimentamos, mas não temos intimidade, mas ele, sedento em sua ganância pediu uma ajuda, uma indicação para algum serviço, quem sabe...
Foi quando tudo que eu conhecia mudou. Aquele menino, que por tanto tempo quis ser apenas um de nós, estar com os mais velhos, simplesmente levar uma vida tranqüila, esse mesmo garoto estava vendendo drogas. E o pior, vendia bem. Foi quando descobrimos que até mesmo quem nunca imaginamos que era usuário. Tudo era novo e surpreendente para ele e para nós quando ouvíamos as histórias. Isso sem contar que o dinheiro estava mesmo vindo em quantias cada vez maiores e ele queria cada vez mais.
E como sempre acreditamos que algo pode mudar, a namorada dele sempre pedia para largar isso tudo, voltar a estudar ter um trabalho honesto, mas ele estava bem, estava por cima, porque é que iria abandonar isso tudo?
E já tudo na sua vida sempre acabava de pernas para o ar, eis que o garoto já com quase dezoito anos tornou-se pai. Foi o que o ajudou a entender melhor o mundo. Seu pai pode não ter sido o melhor exemplo que teve na vida, mas ele queria ser um bom exemplo para seu filho, aquele bebê não teria uma vida como ele teve, seria alguém na vida. Então, para minha surpresa, o garoto, agora pai, largou o tráfico, mas não seria tão simples.
Quando se entra no submundo você faz muitos amigos e uma quantidade proporcional de inimigos. E ele acabou preso. Há quase um ano armaram uma emboscada, não se sabe ao certo o que realmente aconteceu naquela noite em que ele foi preso, justo quando estava totalmente limpo, trabalhando num mercadinho do bairro. Parecia tudo tão bem armado que ele mesmo já tinha duvidas de sua inocência e aceitou ir para a cadeia.
Lá dentro ele reencontrou velhos conhecidos da época que esteve no auge, disse à todos em alto e bom som, que não queria mais se envolver no mundo do tráfico, porque agora ele é responsável por uma outra vida, que assim que a pena acabar, ele tem uma família para sustentar, que quer uma vida honesta, por mais difícil que seja, mas seu filho, vai precisar de um bom exemplo, é só o que ele quer. O tempo passou e sempre temos notícias dele, até porque sua namorada, sempre o visita e nos diz que ele sente falta da época que tudo que ele queria era crescer e poder ir jogar bola conosco. Ele, assim como nós, sempre vai se lembrar dessa época, quando o mundo ainda tinha aquela fina película escondendo algumas coisas de nós mesmos. O que aprendi com esse garoto? O tráfico existe sim, muito perto de você e de mim. Está em todos os cantos e leva junto aqueles que acabam cedendo às pressões, que para muitos é apenas uma fraqueza, mas não é. Não é assim, não importa a sua classe social, grau de instrução, quem somos, basta um segundo de fraqueza, um segundo em que queremos ter o mundo e muito mais para ceder. E começa assim.
É nessas horas que percebo que é preciso um pequeno choque para entrar nisto e que uma vida, pode salvar outra, não é sempre. Não será sempre assim, mas este é um caso que me fez pensar. Depois de tudo o que passou, ele precisou virar pai para entender tudo aquilo que nunca pôde aprender. Talvez ele só queira uma segunda chance, nós sempre damos uma segunda chance para muitas pessoas e situações, mas nunca quando é um caso no qual a pessoa se entregou a criminalidade, não merece perdão. Está em nosso subconsciente. Está dentro de nós. Mas e quando a pessoa é alguém que conhecemos? Seria hora de rever alguns conceitos? Seria este o momento de reflexão que sempre ouço falar e nunca realmente o sigo seriamente? Se é, está na hora de começar a pensar de novo nos meus próprios conceitos, porque agora sei que o mundo se esconde atrás de finas mascaras e nunca sabemos quem realmente é quem, até que as mascaras caiam.

2 comentários:

  1. Li este tempo faz tempo e já conversamos bastante sobre ele, acho q nem tem mais o q comentar.

    Parabéns pela coragem de inscrever seu texto no concurso, não é fácil expor o q a gente escreve para q outros julguem.

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  2. sim, agora vem a sede por estar me inscrevendo, tentando ver onde posso chegar...

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